sábado, 11 de outubro de 2008

Portuários


"Acontece que a donzela - e isso era segredo dela Também tinha seus caprichos E a deitar com homem tão nobre Tão cheirando a brilho e a cobre Preferia amar com os bichos" Geni e o Zepelin, Chico Buarque.


Tomásia, era o nome no anúncio de Jornal, dizia-se morena de olhos chamativos, experiência vasta apesar da pouco idade ... Longas pernas, foi o que me fez chama-la. Esperei exatos 34 minutos, não sabia exatamente o tipo de recepção que se dá a uma puta contratada, quando finalmente chegou. Como era feia a coitada! Tinha longas pernas, e tudo mais que dizia o anuncio ... mas tinha no olhar um pedido de ajuda. Não tive a mínima coragem de consumi-la. Pedi então que se sentasse, ela me disse: _ Você não é o primeiro, estou ainda nos primeiros dias, não pense que eu já tive anos melhores, os quais eu era a melhor puta da cidade, sempre fui isso aqui, o que sobrou da noite, com marcas sim - mostrou-me uma mancha que estendia-se do abdomen até o baixo ventre-não faça essa cara de que não me despreza, é tudo que você possivelmente vai conseguir, se não estivesse tão desesperado não teria ligado não é mesmo? Você é tão baixo quanto eu, são cães assim comparaveis a você que me sustentam, decepcionam-se com a puta feia, mas se lambuzam com elas e ainda acham -se vitimas de propaganda enganosa. -bufou em sinal de alivio- Do que você quer que eu te chame? Nesse momento ela já ia tirando o casaco e perguntando várias outras coisas que eu não saberia mesmo responder, estava atordoado com todo aquele discurso, se eu quisesse uma análise comportamental não teria trocado meu analista por uma garrafa de conhaque, e essa tal mulher era mais uma tentativa de comprar meu refúgio em um falso prazer. Olhei as paredes e como de repente minha própria casa tinha até mesmo o cheiro característico do surreal. A confrontei: _Não sou como você. Puta! Quem lhe dá o direito de me insultar? Você é só mais um produto achado no mundo que veio a servir meus caprichos. Cansei de mulheres me dizendo quais meus defeitos ou qualidades, nunca precisei disso, posso muito bem me virar sozinho, sem essa .. qual é mesmo o nome da palavra... Intimidade. Tomásia baixou os olhos , falou num tom de voz doce: _Intimidade foi tudo que eu nunca tive, a vida toda cacei a sombra de um respeito que nem eu nunca me dei, fui a pior de todas as covardes fugi para tão longe de mim mesma que quando tentei retornar... achei a noite, e a sua mesma garrafa de conhaque, só que a minha tinha o nome Coragem. Virou-se com os olhos cheios de lágrima, não quis pagamento saiu apressada. Tomásia foi a primeira mulher que eu não amei. Tomásia foi minha âncora para a realidade da solidão auto-sentenciada.



Lais Castro

Um comentário:

Amanda Biasi disse...

Esse texto é seu, Olive Hoover?
sério, Laís
muito bom

de verdade.